monaliso

Eu gosto dele.
como quem gosta.
De um quadro na parede.
nem torto, nem feio, nem chato.
um porta retrato. mudo.
me sorrindo sempre.
sem descordar, implicar, reclamar.
ou deixar de sorrir.
de tão bacana.
me cansa.

De tão pouco me olhar. de tanto sentir. decorou. engoliu. revirou. de ponta à cabeça. de dentro pra fora. avesso do contexto. no meio da linha. a beirada do peito. o play do meu som.
de um jeito. que eu já nem tento. ah. nem tento.

Ele sabe. o que meu rádio toca. o jeito que atravesso a rua. o que eu falo, de quem eu falo, pra quem eu rezo, por quem eu morro.

Ah. ele é metido de mais, pra cansar de ser deus.

Ana:
não vai ver novela?

Júlia:
falta 5 minutos pra começar..
pelas minhas contas..

Ana:
eu perdi as contas.
do seu colar de pedras.

Júlia:
meu rosário de estrelas transparentes fica pendurado na janela.
cada estrela é uma ave Maria que não dorme.
vigia.

Ana:
seu rosário de estrela morta
as vezes parece que não dorme.
as contas brilham, espiam.
não piam nem me contam.
as vezes sangram.
esquecem que não vivem.

Doente, eu mal consigo me manter em pé. Tenho febre e minha pressão cái, junto com o céu, na minha cabeça. Anoitece, amanhece, e nada muda.
Eu não era assim. tão sem força. cética, metafísica e doente.
não tinha medo, de ter medo. de não ter caráter.

Eu, que dizia tudo. fico quieta. clausta.
não falo mais. nem a verdade.

podemos ficar loucos.
ou pra todos os efeitos,
suspeitos
de ser verbo, sem sujeito.

sujeita.

Almoço com o Caio, quase sempre, num restaurante sem placa. Ele disse que eu tenho o lado direito maior que o esquerdo, e depois disso, eu fico olhando minhas mãos, fazendo esforço pra perceber que a direita é maior. Lucas não acha. E tenta fazer com que eu volte pra faculdade. Meu pai disse que o importante é eu ser feliz. E Júlia gosta do meu jeito de fotografar pessoas, ela acha expressivo. A Márcia diz que expressiva sou eu. Por isso não sei mentir. Clarissa fala que eu sou exagerada, e faço tempestade em copo de água. Milene e Marcelo não se falam mais, e falam sempre que a moça do filme é igual a mim (brilho eterno de uma mente sem lembrança). Nunca lembro de comer verdura, e minha mãe acha que vou ficar anêmica. de novo. Elenice disse que eu não faço bagunça, e que não vai fazer batata frita hoje. Minha avó me acha inteligente, e também que não tiro proveito disso. Heloísa não suporta minha agenda “cult”, e se acha no dever de me salvar, “vamos pro buteco prima”, eu nunca resisto. sempre me acabo por lá.

Dublado.

Hoje não é dia. nem de dia é dia. porque pulou pra fora do calendário.
e ninguém viu. o dia fugir ontem a noite.

então eu fico comendo brigadeiro e vendo amélie poulain.
dublado mesmo. porque isso não me chateia hoje. nem desgosto. de gosto.. só o do brigadeiro. outras vezes nem isso.
As vezes é muito tempo. em câmera lenta. legendado. disfarçado. amaldiçoado.
Tudo que eu cozinho queima.

todos os dias meu café esfria. minha saudade mata. meu silêncio grita.
minha gaita enferruja. meu travesseiro sonha. minha fome come. meu menino some. por trás do allstar verde.

mas deixe. que tudo da cozinha se queime. que a geladeira fique aberta. que o dia fuja. pra onde não existam relógios.

ainda tem brigadeiro. e amélie poulain.

Segunda-feira. denovo. De novo acordo 5:30, e imploro por 5 minutinhos. Será que dá pra matar a primeira aula? Qual é a primeira aula?
Acordo. acho. 5:40. aqui não tem café. no cursinho tem.

De novo vou pra sala sem os livros, porque se abrir meu armário, vou ficar soterrada naquela bagunça. Alguém prometeu arrumar. esqueci. esqueceram. talvez arrume. amanhã.

Talvez espere de mais, e não saiba mesmo quem eu sou. sei que não estou aonde não queria estar. já é alguma coisa.

Pensei em pintar o cabelo. e dessa vez pensei antes de fazer. ainda não sei qual a primeira aula, mas sei que hoje é segunda, e às 13:00 almoço. em algum restaurante da av. espirito santo. não como carne. mas roo unha.

02:05. ainda é ontem.

confio

Desconfio de deus, das horas, da mentira, do que eu sinto.
Sinto minhas mãos. as tuas frias… não. sei como atravessar a rua, aprender matemática, falar, morrer, rezar, não sei.

Cansei de ser verbo, sem credo, intransitivo. Sujeito indireto, aposto, viciei. Agora não tem jeito, de olhos fechados, confio.

minha cabeça ta latejando agora. queria vomitar você. tirar do meu estômago essa coisa que morre e me mata ao mesmo tempo.

acho que parei de pulsar, dormir, comer, respirar. de sentir não.
e eu sinto muito.

faz tanto frio, que já nem sei aonde estão meus pés.
os sinais fecham, abrem, e ninguém sabe pra onde ir.

quase uma semana, e nem me lembro mais.
talvez quisesse chorar, mas estou seca.
maldito frio.

ainda sinto muito.